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Os investigadores do manguezal13.04.15

Os pequenos visitaram o berçário de diversas espécies e descobriram como preservá-lo

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Nos arredores do CEI Odorico Fortunato, em Joinville, a 186 quilômetros de Florianópolis, o chão é úmido e coberto por uma baixa vegetação, que revela buracos por onde saem pequenos e velozes caranguejos. Mais alguns passos e a terra dá lugar a um corredor de água margeado por árvores de caule fino e folhas verdes onde diversos pássaros param para descansar. Essa é a paisagem que Kayky Gabriel da Silva Sobral, 6 anos, vê quando observa o manguezal. Antes de participar do projeto desenvolvido pela professora Paula Aparecida Sestari, ele e seus colegas não prestavam muita atenção no espaço ao lado da escola, visto como um lugar sujo e malcheiroso em que os moradores do bairro jogavam lixo.

“Queria mudar esse olhar e chamar a atenção das crianças para a importância desse ecossistema tão próximo”, conta a educadora. Depois de conversar com os pequenos e coletar depoimentos deles sobre o manguezal, a docente formulou um questionário destinado aos pais. A devolutiva mostrou que muitos não sabiam explicar o que era aquele espaço, nem conheciam sua ligação com a Baía da Babitonga – a porção de mar rodeada por terra em que desemboca o braço de rio ao lado da escola. A relação deles com o ecossistema era puramente predatória, ligada à extração do caranguejo e à pesca, o que reforçou a necessidade de abordar o tema com a meninada.

Para explorar o lugar, as crianças foram até ele mais de uma vez. Inicialmente, a professora as convidou a observar os sons, a cor da água e os animais que apareciam nas margens. Com o tempo, elas passaram a desenhar tudo o que viam nas visitas. “A tarefa permite identificar a utilidade do registro como memória e instrumento de comunicação das experiências vividas”, aponta Telma Vitória, professora de Fundamentos da Educação Infantil da Universidade Federal de Alagoas (Ufal). Outras possibilidades de guardar as impressões de lugares fora da escola é disponibilizar máquinas fotográficas. Ou o professor, na condição de escriba, escrever as observações narradas pelos meninos e meninas.

Em sala, Paula destacou a ligação entre o local nos fundos da instituição e a natureza da região, mostrando uma foto do prédio do CEI tirada do alto. A imagem revela o manguezal ao redor e uma faixa de mar, que logo saltou aos olhos. “Tem uma praia aqui perto?”, perguntou um dos meninos. A educadora explicou que a porção de água vista por eles era a Baía da Babitonga, o encontro do rio com o mar. Para complementar, levou mapas e fotos antigas e recentes do lugar.

Quando perguntados sobre os animais típicos da região, os pequenos citavam apenas o caranguejo. Para ampliar o repertório deles, Paula leu alguns exemplares da revista Menino Caranguejo, organizada pelo Instituto Caranguejo de Educação Ambiental, que contêm histórias em quadrinhos sobre a fauna encontrada em ambientes costeiros brasileiros. Além do material, a turma teve acesso a fotos e textos com informações sobre a saracura-do-banhado, o jacaré-de-papo-amarelo e a tartaruga marinha, entre outros.

A atividade foi complementada com pesquisas feitas pelas próprias crianças, que manuseavam os materiais, procuravam imagens nas revistas e livros disponíveis e pediam para a professora ler e confirmar se era mesmo o que buscavam. Essa etapa mostra que a pesquisa não é exclusividade de quem já sabe ler. Encorajar os pequenos a buscar informações em livros e revistas é uma das formas de familiarizá-los com textos informativos. Assim, eles ampliam o leque de gêneros textuais conhecidos. “É importante selecionar informações e diferenciar o que está dito do que se imagina”, aponta Maria Virgínia Gastaldi, formadora do Instituto Avisa Lá. “Assim, as crianças aprendem a distinguir os conteúdos e conhecem outro gênero além da ficção, que tem o seu papel, mas não precisa ser o único explorado na Educação Infantil”, complementa ela.

Depois da leitura, houve uma roda de conversa sobre o manguezal e seus habitantes. “Vimos que todos os bebês precisam de cuidado, os humanos e os animais. Os filhotes de várias espécies, principalmente peixes, têm nesse ambiente um lugar privilegiado de desenvolvimento graças ao material orgânico disponível”, conta Paula.

A turma discutiu também o prejuízo que a sujeira causa à natureza. Com o depósito de lixo, o lugar fica poluído, a fauna sofre as consequências e passa a correr risco de extinção. A meninada, então, produziu uma maquete de como seria o manguezal ideal, com a argila substituindo o solo, todo limpinho e povoado de borboletas, caranguejos e pássaros de papel (leia a entrevista abaixo sobre como fazer projetos de meio ambiente).

Ao navegar, mais aprendizado

Com o auxílio da direção e a presença dos pais, a professora levou as crianças a um passeio de escuna pela Baía da Babitonga. Lá, eles conheceram a grandiosidade do porto, o tamanho da baía e, ao longe, a cidade histórica de São Francisco do Sul, a 196 quilômetros de Florianópolis. O ponto alto do passeio foi a observação das toninhas, uma das espécies conhecidas como golfinho. “Professora, é por isso que as toninhas gostam de viver aqui, a água é tão calminha!”, comentaram os navegantes mirins.

A saída foi tema de muitas rodas de conversa. As famílias trocaram fotos e os pequenos relacionaram o que aprenderam em sala com o que viram. “A experiência é rica pois coloca a criança na posição de questionar o mundo e formular hipóteses sobre o que está ao redor”, diz Rosana Dutoit, do Instituto Abaporu.

Lembrando da maquete construída anteriormente, a turma avaliou que não seria possível fazer a mesma reprodução da baía porque ela é muito grande. A professora, então, ambientou a sala de modo que se assemelhasse ao fundo do mar. Para isso, usou um pano azul, luz e sons apropriados. Os animais da região foram confeccionados pelas crianças com esculturas de jornal e papelão. O novo espaço chamou a atenção das outras turmas e dos pais, que ficaram instigados a entrar e conhecer o que havia dentro da sala. Ao chegar, os visitantes encontravam a turma de Paula disposta a contar, com naturalidade, quais são os animais típicos da região e o que o ecossistema do ladinho da escola tem a ver com o mar tão grande visto por eles.

Tamanho envolvimento colocou o manguezal no centro das atenções. E as crianças passaram a querer observar a dinâmica do lugar com mais frequência. Diante de tanta curiosidade e empolgação, Paula solicitou o apoio de uma empresa local,8 que construiu o observatório do mangue: uma casinha de madeira posicionada acima do nível do solo. Quando as crianças sobem, têm uma vista privilegiada.

A estrutura está disponível para outras unidades próximas que também desenvolvam projetos sobre o ecossistema e continuará como um dos tantos espaços de exploração e brincadeiras que os pequenos encontram no CEI. Cada vez que sobem nele, Kayky e seus colegas descobrem algo novo, ficam encantados com as atividades dos bichos e monitoram a limpeza do vizinho, agora bem mais querido. “Olha, tem um sapato boiando na água. Não pode, é poluição, né?”, alertam.

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